O tempo vai passando e nossa memória olfativa só vai aumentando. Começamos a perceber cheiros estranhos, mais sérios. Cheiro do chão de madeira antiga da escola, a impressão que dá é de que esse cheiro vai ficar registrado nas narinas até o fim da vida. Cheiro de papel novo no começo das aulas, de tinta de caneta. Cheiro de papel de carta e lápis de cor na aula de artes.
Cheiro de escola nova umas cinco ou seis vezes, papel reciclado, encrencas. Cheiro de álcool, cheiro de cigarro. Pra uns esses cheiros prosseguem, para outros não. Cheiro de perfumes dos mais variados, chegamos a nos sentir em um desfile de fragrâncias, uma mais apelativa do que a outra.
Sentimos cheiro de perigo, de adrenalina, alguns sentem cheiro de sangue - até mais vezes do que gostariam. Cheiro de cadáver esverdeado no fundo do tanque de aço inoxidável.
Os cheiros vão variando ao longo da vida. Logo surge o compromisso, para alguns com cheiro de fim da linha, para outros, com cheiro de manhã ensolarada depois de um dia de chuva, mostrando que sempre acontece um recomeço. Algumas vezes podemos nos dar o prazer de sentir o cheiro de vida nova, apartamento novo e recém decorado, cheiro de torta de limão e domingo no sofá com a pessoa que mais queremos por perto.
E assim vamos, sentindo cheiros e provando as sensações que eles nos proporcionam, algumas boas e outras melhores, contribuindo com as nossas lembranças, com o nosso caráter e por fim, depois do cheiro de comida que já não é mais a mesma e da poeira acumulada nas pregas da poltrona sentimos um cheiro que jamais ninguém vai poder dizer como é: o da morte se aproximando e dando seu ultimato, sem confirmar que o céu tem cheiro de baunilha: já não pertencemos mais a esse mundo de perfumes inusitados.
(txt: aninha, eu e o meu inferno.)
0 comentários:
Postar um comentário